O Brasil e a Europa estão mais próximos desde o dia 1º de junho. Não em distância, claro, mas em tempo de transmissão de dado com a inauguração do primeiro cabo submarino de fibra óptica entre o país e o velho continente.
Uma das principais vantagens de ter um gigantesco cabo instalado no fundo do oceano é uma menor interferência durante a troca de informação do que pelo uso de um satélite na órbita do planeta.
"Toda tecnologia que funciona por meio de satélites geoestacionários (aqueles que completam em órbita a rotação ao redor da Terra no tempo de 24 horas) está sujeita a interferência, sobretudo em dias de chuvas e tempestades", explica Cristiano Panazio, engenheiro de telecomunicações e professor na USP (Universidade de São Paulo).
A estrutura também possibilita uma menor latência, ou seja, um intervalo de tempo menor entre ação e reação, e, consequentemente, uma comunicação mais eficiente.
"Enquanto um satélite geoestacionário está instalado a cerca de 36 mil quilômetros de altitude, para além da órbita da Terra, um cabo submarino tem apenas alguns milhares de quilômetros de extensão, fazendo com o que o dado seja enviado muito mais rapidamente", diz Cristiano.
O físico Eric Fagotto, professor do curso de Engenharia Elétrica da PUC-Campinas (Pontifícia Universidade Católica de Campinas) destaca com vantagem a vida últil da estrutura que cruza o mar. Um cabo submarino permanece em operação por 25 anos, já um satélite consegue funcionar por até 10 anos. Além de durar mais, o custo para a instalaçaõ é menor na água do que no espaço.
Fagotto compara o projeto Starlink, da SpaceX, empresa do bilionário Elon Musk, que tem como objetivo oferecer acesso rápido à internet em qualquer lugar do mundo por meio de 12 mil satélites de baixa órbita com o investimento para a instalação do cabo Brasil-Europa.
"Com esses 12 mil satélites, a SpaceX pretende atingir a capacidade de 247 terabits a um custo de US$ 250 milhões (R$ 1,26 bilhão) por satélite, totalizando US$ 3 bilhões (R$ 15,16 bilhões)", diz. "O cabo que conecta o Brasil e a Europa, por sua vez, tem capacidade para 100 terabits e demandou um investimento de € 185 milhões (R$ 1,22 bilhão)."
De acordo com Panazio, atualmente, são transmitidos por cabos submarinos quaisquer tipos de dados digitais, como fotos, vídeos e áudios. Fagotto complementa que cerca de 98% do tráfico da internet transita hoje pelas estruturas subaquáticas.
O cabo recém inaugurado impacta diretamente na vida dos brasileiros. Enquanto um dado enviado por satélite leva centenas de milissegundos (um milésimo de segundo) para chegar ao destino final, a comunicação via cabo submarino tem uma latência de cerca de 60 milissegundos.
"Se levado em consideração atividades como vídeo conferências e jogos online, uma latência de centenas de milissegundos já seria relativamente importuna", afirma Panazio. "Em outros cenários, como no mercado financeiro, por sua vez, essa latência se tornaria impraticável."
No caso específico do cabo submarino que liga o Brasil e a Europa, há ainda uma outra vantagem: a estrutura não passa pelos Estados Unidos, o que encurta a distância percorrida e proporciona atrasos ainda menores. Até então, a maioria das transmissões passavam, necessariamente, pelos EUA.
Um sinal saído de Fortaleza, por exemplo, chegará em Lisboa após cerca de 60 milissegundos e percorrerá a distância São Paulo-Marselha (França) em 120 milissegundos. Os tão esperados benefícios da tecnologia 5G dependerão não somente de alta capacidade, mas também da baixa latência.
"Há ainda a previsão de se disponibilizar parte da infraestrutura do cabo para pesquisas e educação, o que poderá contribuir para o desenvolvimento das novas tecnologias para a internet e a inserção digital", diz Fagotto.
"Em resumo, trata-se de um cabo moderno, de alta capacidade, que abre portas para a utilização e o desenvolvimento de novas tecnologias, inserção digital e, como não poderia deixar de ser, grandes negócios. Não há dúvidas de que todas essas atividades serão beneficiadas por esta infraestrutura independente e mais segura", completa.
*Estagiária do R7 sob supervisão de Pablo Marques